Malu Carvalho
Na esteira das inovações tecnológicas presentes na rotina de produção do repórter, a disciplina Jornalismo e Tecnologia, obrigatória do 6º ciclo, apresenta aos alunos a chance de entender e experimentar as novas ferramentas. Doutor em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ), o professor Fábio Vasconcellos aborda as transformações da linguagem e apropriação das novas tecnologias com uma perspectiva crítica do momento atual da profissão.
Vasconcellos atuou por 18 anos em redações, no Jornal do Brasil e O Globo, e leva a experiência de mercado às discussões e ensinamentos em sala. As aulas da disciplina possibilitam momentos em que a teoria encontra a prática pelo olhar de um jornalista que já vivenciou os processos produtivos de uma redação. Segundo Vasconcellos, o intuito é que os conceitos não fiquem abstratos, mas, por outro lado, que as aulas não sejam apenas técnicas e aplicadas.
– Curiosamente, eu sempre fui um jornalista com uma preocupação muito grande com a parte acadêmica, com a formação da teoria. Não sou daqueles que olham a teoria como questões meramente abstratas. Ela, na verdade, ajuda a formar quadros interpretativos e compreensão para manejar ferramentas. É uma mistura interessante, porque a redação dá ao profissional um tempo de produção e uma busca permanente por eficiência.
Vencedor de prêmios como o Vladimir Herzog de Direitos Humanos, ESSO e IPYS de Jornalismo Investigativo, Vasconcellos se especializou em jornalismo de dados. Além do gosto pessoal em tecnologia, ele trabalhou o tema no Doutorado, que já dialogava com o uso de Inteligência Artificial (IA). Antes, o jornalista lidava apenas com tecnologias triviais em uma redação, mas, segundo ele, o jornalismo de dados deu um salto para um jornalismo computacional, uma etapa mais avançada.
O jornalismo enquanto atividade se desenvolveu com a evolução tecnológica desde o início, com a prensa, no século XV, até se transformar em uma indústria da comunicação ao longo dos séculos, destaca Vasconcellos. A disciplina abraça este universo e apresenta, inicialmente, os modelos de negócio do jornalismo nos séculos XX e XXI, em uma comparação com base na influência da revolução tecnológica. Em outra etapa, o professor inclui o estudo de tecnologias mais
disruptivas, como a IA aplicada ao jornalismo.
– Não dá para fazer hoje jornalismo sem tecnologia. Essas transformações afetam diretamente como você faz, embrulha, distribui e consome notícia. Todas as etapas são impactadas pela tecnologia da informação. Fazemos um percurso de perspectiva crítica e colocamos o jornalismo dentro desta equação para compreender os impactos negativos para profissão, atividade, negócio e, também, para a sociedade.
Vasconcellos propõe a experimentação das tecnologias estudadas como base de discussões e debates. O objetivo final é desenvolver nos alunos um olhar amplo e crítico frente ao momento que o jornalismo atual atravessa.
O professor explica que as universidades, de maneira geral, não acompanham as mudanças na mesma velocidade que o mercado, que tem um tempo de substituição e aplicação de inovações mais rápido. No caso do jornalismo e das tecnologias, ele aponta, a Academia é o lugar ideal para parar, questionar e analisar o uso de novas ferramentas. De acordo com ele, ao unir experiência do ponto de vista prático com bagagem intelectual, o aluno sai da universidade mais confortável para navegar em um ambiente profissional com constantes novidades.
– Ter essa discussão antecipadamente fornece aos estudantes ferramentas práticas e intelectuais que eles podem aplicar de forma eficiente, ética e humanizada, com um propósito alinhado ao jornalismo e à missão de informar.
Debaixo do guarda-chuva da disciplina, está o jornalismo de dados, tema abordado em algumas aulas como técnica de apuração. A especialidade costuma ser utilizada no processo de construção de pautas, seja como ponto de partida ou como forma de pesquisa. A partir de bases de dados públicas, por exemplo, o jornalista consegue achar estatísticas e traduzi-las em informações que explicam comportamentos e situações. Vasconcellos participou da cobertura das Eleições
Municipais de 2020 e Presidenciais de 2022 na TV Globo e no G1 com a coleta de dados em bases extensas para a produção de reportagens de interesse público.
– Temos que ver o que é notícia ali. É uma visão diferente de um cientista de dados, eu olho com a perspectiva jornalística. Vejo onde pode estar uma bela história para contar. Esta é a diferença dos jornalistas que aprendem ou têm gosto pelo uso desta tecnologia para apurar e investigar histórias.
Quando fala de informação, Vasconcellos precisa abordar em aula as questões que permeiam o jornalismo no meio digital. Além do modelo de negócios modificado por esta nova lógica, ele desdobra a mudança nas formas de consumo de notícia. O professor ressalta o espaço aberto para influenciadores, que apesar de usarem bases jornalísticas, como fontes, evidências e declarações, não têm o senso de responsabilidade social que o jornalista tem. Ele destaca que com a desigualdade competitiva no ambiente digital, os profissionais devem estar presentes na lógica do meio sem assumir uma perda autoral, mas com a afirmação da linguagem jornalística no modo de fazer notícia.
– Os alunos ficam um pouco desnorteados com essa perspectiva crítica, mas acho que é um elemento importante para eles inventarem e serem criativos. O objetivo é estimular a reflexão sobre alternativas e inovação de linguagem. Temos que entrar no meio e fazer a nossa forma com recursos que consideramos relevantes.